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terça-feira, 16 de junho de 2015

Fazendo um Nut/Pestana de Osso para o Violão

Nesta postagem vou demonstrar minha experiência com a fabricação de uma pestana (ou nut) para violão usando osso como matéria prima e ferramentas de baixo custo.

A primeira coisa a se fazer é achar um bom osso para começar a moldar a peça.  Você pode comprar ele cortado em lojas de instrumentos musicais ou fazer seu próprio usando canela de boi. Escolhi a segunda opção por sair bem mais barato e me dar a oportunidade de fazer outras peças no caso de erro.

 Não vou entrar em detalhes sobre como proceder no corte e limpeza do osso. Mas recomendo essa postagem para quem se interessar: Link






Após o corte do osso, terminei com várias peças deformadas. Recomendo observar bem e escolher aquela que mais lembre as medidas da sua pestana original. Certifique-se também de pegar uma peça com bastante material sobrando para depois não terminar com uma pestana baixa ou muito fina.



Selecionada a peça, começa o processo de medir o osso de acordo com a pestana original, cortar o excesso, lixar e retificar até você acabar com um pequeno bloco de osso que se encaixa tranquilamente no seu violão.
Na segunda foto, uso uma lima murça para desgastar a parte mais elevada do osso e deixar ele mais aceitável para deitar na lixa e começar a retificar.


Para facilitar, pintei com grafite de lápis toda área que vai entrar em contato com a lixa.  Os locais onde ainda permanecerem as marcas de lápis são áreas mais fundas. Quando toda a área estiver limpa, quer dizer que consegui algo perto de uma superfície reta.

Agora você gastará vários minutos (talvez horas) do seu tempo na lixa. Na minha opinião, qualquer lixa de granulação menor que 80 é imprática para o osso. Algo em torno de 100 e 150 seria o ideal para remoção agressiva de materiais. No meu caso, usei lixas 80 e 60 para remoção bruta  e 320 para retificar e polir. Também usei lixas 600 para um melhor brilho.



Certifique-se de começar retificando a base e o lado da pestana que ficará virado para a escala do instrumento. O ideal é um ângulo de 90º. Por isso, sempre procure usar a lixa em uma superfície reta e sempre evitando balançar o osso durante os movimentos.



Nestas duas fotos: um exemplo do problema que alertei anteriormente. Lixando a pestana em uma superfície que não era reta o bastante, terminei com uma pestana que se afastava da escala do instrumento ao por tensão nas cordas. Ouve-se o som normalmente, mas a distância já é o bastante para atrapalhar a entonação do instrumento. Além de ouvir pequenas vibrações saindo da pestana ao tocar uma corda com força.




Depois de vários minutos na lixa, consegui retificar a maior parte da superfície. As marcas de lápis ainda indicam um lado mais baixo. Mas como a pestana não precisa ser tão alta e eu ainda vou precisar de bastante material para trabalhar os outros lados. Resolvi remover a parte marcada com... mais lixa. : (



 Cá está. Não precisei retificar essa parte perfeitamente pois escolhi ele para ser o topo da pestana.


Encaixe quase perfeito. Bem melhor que a antiga pestana. Agora vamos medir o raio e altura onde faremos os cortes para as cordas.






Usando um lápis lixado pela metade e deitado no braço do violão, é possível marcar o raio e o limite da profundidade da passagem das cordas. Já o lápis inteiro serve para marcar o raio e a altura da pestana.



Depois é só usar uma lixa ou lima para desgastar o nut até a primeira linha marcada (altura da pestana).

 Caso queira saber a medida exata do raio da sua escala, pestana ou rastilho; baixe os arquivos desse site: Link
Graças ao pdf fornecido, pude descobrir que o raio da minha pestana é de 16 polegadas. Basta imprimir em uma folha de A4 e recortar.




Por último, antes de começarmos a medir espaçamento de cordas e serrar os slots para as cordas, vamos criar uma rampa na parte traseira superior da pestana. Isso facilitará ao serrar os slots das cordas, além de ficar de acordo com a pestana original. O topo completamente reto pode causar problemas de entonação e trastejamento.


 

Baseando-me pela pestana original do meu violão, concluí que seria melhor baixar mais um pouco o topo. Também aproveitei para melhorar a rampa traseira e terminar com um polimento em lixa 600. Percebam o reflexo na segunda foto. Lixas de granulação maior deixarão um melhor resultado.



Após moldar o osso, resta definir o espaçamento e cavar as ranhuras para o descanso das cordas. Você pode usar as medidas da pestana original, medir por olho ou usar uma régua.


No meu caso, usar a pestana está fora de questão. Por ter sido feito de plástico, a tensão das cordas foi desgastando rapidamente as ranhuras. Eu teria a medida correta com as cordas de calibre menor. Mas ficaria perdido nas maiores. Por isso resolvi usar a régua.


Comecei medindo a distância das duas cordas Mi do final do nut. Usei 3/16 de 1 polegada (4,762 mm). Tirei essa medida da minha pestana original (ao menos para isso ela prestou). Um lápis de ponta bem fina ajuda na precisão.


Em seguida, dividimos a parte interna do rastilho em cinco espaços de medidas iguais. Na prática não consegui fazer isso. Sempre acabava com o quinto espaço maior que os demais. Também devemos notar que que as cordas Mi (grave), Lá, Ré e Sol são revestidas e tendem a ocupar mais espaço que as mais finas. Nesse caso, usei 7,5mm de espaçamento e procurei dar alguns milímetros a mais para as cinco cordas revestidas. Terminei com algo aceitável.



Para evitar que as marcas se apaguem, usei essa lâmina de serra retificada para marcar a pestana. Você também pode usar um estilete. Peguei a ideia nesse vídeo do Luthier Beto Nalin: Link

 A partir daqui, você precisa ter a certeza de que está com o espaçamento correto. Ainda é possível lixar o topo para remover as marcas da serra e repetir o processo. Mas o ideal é que você resolva as medidas no lápis. Preservar o material no topo do rastilho é mais que essencial nesse momento.

 
 
Finalmente a ferramenta que usaremos para cavar as ranhuras da pestana. O calibre de folga é encontrado em lojas de ferramentas para mecânicos. Além de ser barato, vem com medidas que chegam perto ou até igual aos das cordas de violão. O meu custou algo em torno de 23 reais e veio com 20 medidas de 0.05mm até 1mm. Basta selecionar as medidas relativas as cordas do violão e adicionar dentes aos medidores.



Estarei usando cordas D'Addario 0.011 Phosphor Bronze. Procurando no site da fabricante, podemos ver as medidas em milímetros, polegadas e a força da tensão de cada corda.

De acordo com meu calibre de folga, usarei:

0.25mm para a corda Mi aguda
0.40mm para a corda Si
0.55mm para a corda Sol
0.80mm para corda Ré
1mm para a corda A
1mm para a corda E grave

Como a ferramenta limita-se a medir até 1 mm, precisarei de outro método para ter o diâmetro real da corda E grave. Mas isso será explicado no futuro. Todas as outras lâminas chegam perto dos valores pedidos pelas cordas e devem servir. Mas antes....


Explicarei como criei os dentes nos calibres de folga. No meu caso, usei uma micro retífica com um disco de corte. Você também pode usar uma lima agulha no formato faca ou triangular. Vai ser mais complicado de criar os dentes mas com paciência você terá algo perto da imagem.
Existem discos mais resistentes como os usados para cortar metal, mas eles tendem a criar cortes imperfeitos e desgastam lâminas menores rapidamente. Já os mostrados na foto, apesar de desmancharem mais rápido, conseguem fazer cortes precisos e finos. Gastei de 3 a 4 discos para criar dentes em 10 lâminas do calibrador. Use uma máscara durante o processo pois o disco vai esfarelar e empoeirar todo o local.


Após criar os dentes, é necessário lixar as laterais da lâmina para que os dentes fiquem com um formato redondo. Isso fará com que as ranhuras obedeçam o formato redondo da corda.


Uma foto mais detalhada dos dentes. Notem como ficou redondo após a lixa.


Agora é só usar as lâminas com as respectivas medidas das cordas para começar as ranhuras.
Atenção dobrada com o limite marcado pelo lápis.
 
Essa imagem demonstra como o slot da pestana deve ficar no final. A linha vermelha representa a corda do violão, que toca uma pequena parte no começo da da pestana e desliza pela rampa até chegar até as tarraxas. Para alcançar essa forma é necessário serrar apoiando as lâminas em um ângulo diagonal como mostrado na foto anterior.


Quase lá. Notem que sempre paro de serrar quase em cima da linha do lápis. Isso deixará os slots de acordo com o raio da escala.




Este é o resultado. Esteticamente, está horrível, mas isso será resolvido com lixas e polimento. A linha do lápis ainda continua para mostrar que as ranhuras obedeceram a curvatura da escala do violão. Na terceira foto, já comecei a diminuir o topo da pestana com a minha lima.



 Lembram do problema do calibre de folga não ter a medida que chegasse perto da corda Mi grave? Resolverei isso usando a própria corda Mi para limar e abrir a ranhura. Graças ao revestimento, as cordas também funcionam como abrasivos. Com o encordoamento completo, é possível limar as ranhuras Sol, Ré, Lá e Mi grave. As duas mais finas podem ser polidas com o item da segunda foto. O limpador de bico de maçarico custa algo em torno de 5 reais e vem com várias medidas. Não são perfeitos mas conseguem cumprir razoavelmente a função de polir.


Resultado da pestana já instalada. É possível notar que as cordas graves ficaram mais próximas umas das outras ao contrário das agudas. Nada que atrapalhe na hora de tocar. Também destaquei a tinta descascada na cabeça do violão. O dano foi causado ao tentar colocar uma pestana décimos de milímetros maior do que a original. Aprendendo da pior forma...



Com a parte mais crítica terminada, posso começar a retirar tranquilamente o restante do osso do topo da pestana com a lima. A segunda foto mostra o quanto de material ainda passa das cordas. Recomenda-se que metade ou 1/3 da corda fique exposta acima da pestana para evitar problemas na afinação.



Feito.


Uma boa forma de testar e ver se as cordas estão passando livremente é primeiro tocar a corda e pressionar ela após passar da pestana. É possível notar que quanto mais a corda está livre, mais fácil é dela ser influenciada pela pressão traseira.


  Para o último ajuste, vou avaliar a altura da pestana e caso eu não esteja satisfeito, vou lixar levemente a base dela até chegar a algo confortável de se tocar.
 Primeiro, pressione as cordas mais grossas para se certificar que estão devidamente fixas nas ranhuras.




Em seguida, pressione a corda do violão no meio da terceira casa e veja o espaço que existe no primeiro traste. Pelas duas fotos, é possível notar que existe um bom espaço que pode ser diminuído com umas leves lixadas. Peguei essa dica com o site frets.com. Link do assunto.

 Uma pestana alta não necessariamente precisa ser reduzida! Tudo depende da força que o músico toca. Caso eu usasse cordas 0.010, não precisaria estar fazendo esse ajuste pois são cordas leves que não deixam minha mão esquerda dolorida.





Difícil de notar o espaçamento na Mi grave, mas está lá. Por alguns segundos, pensei que tinha estragado a pestana mas depois de afinar as cordas, não notei trastejamento. Na Mi aguda ainda é possível notar um mínimo espaço. O que é bom!





 Restam agora pequenos ajustes e um pouco de polimento com lixa. Resolvi arredondar as bordas e aplicar grafite nos espaços das cordas para facilitar a passagem das mesmas. Você ainda pode usar água oxigenada para branquear mais ainda a peça ou dar uma cor de antigo com chá. Preferi a cor natural por preguiça.


Pestana já instalada e violão afinado.  Recomendo colar a pestana com alguns pingos de super bonder. Você também pode usar a própria tensão das cordas para segurar a peça. Porém, a cola garantirá que ela não vai escorregar alguns milímetros para o lado devido a bends ou desafinação.


Terminado. : )

Ótima ação nas primeiras casas e com cordas 0.011. O rastilho também foi feito durante a confecção da pestana. Mas isso será mostrado em outro post no futuro.

Boa Sorte!